segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Tons


Tons
Os tons de fim de tarde transportam toda a gente para algum lugar. O laranja e o vermelho pegam-se aos olhos e nao nos deixam largar as recordações. Começam por morder baixinho, por falar levemente, mas arrasam como uma aragem de saudade. Lentamente, muito lentamente. E com doçura.
Levam-nos lá. Lá onde nos pegam na mão e nos levam por atalhos sombrios, lá onde nos tocam a alma e nos prendem a razão, lá onde nos beijam com o espírito e despedaçam o coração. Lá onde se sofre e onde se cresce, onde se ama e onde se morre. Lá onde ficamos para sempre, mesmo que os tons mudem e os atalhos se fechem. Ninguém chora baixinho, ninguém corre devagar, ninguém ama sem naufragar. Quando as estradas se fecham, já não se abrem outras iguais. 
Os amores têm pontos finais. Como quando o sol se põe, deixam a sua cor. Deixam fotografias e as fotografias não se revelam duas vezes. E o poder do pôr-do-sol é este e só este: o da analogia com os nossos próprios finais: quentes, latejantes, vagos, vazios, arrepiantes.
Como gritos que não se ouvem lá fora mas que quebram os vidros cá de dentro. Como cores que pintam os céus mas esvaziam as almas.

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